Ao contratar nova alta de 0,75 pp na Selic, Copom começa a correr risco de exagerar, diz JGP

Notícias | 06/05/21

Por Felipe Saturnino, Valor — São Paulo

A alta da Selic sem dúvida é necessária no atual momento, mas, ao anunciar nova elevação de 0,75 ponto percentual do juro básico para a reunião de junho, o Banco Central começa a correr o risco de cometer um exagero, diz Fernando Rocha, economista-chefe do JGP. “Acho que, a partir de junho, o Copom vai ter que passar a sinalizar movimentos mais moderados”, afirma ele.

Rocha nota que a inflação no curto prazo deve se manter em alta, em um contexto de preços de commodities ainda em alta. No entanto, ele avalia que seria mais apropriado observar como os preços da economia reagem à recente alta de 1,5 ponto da Selic nos últimos 90 dias antes de adiantar uma nova elevação do juro básico.

“Sabemos que a política monetária tem um efeito defasado. E sabemos que o ambiente econômico muda muito conforme o tempo passa, de tal forma que as commodities, hoje nos topos históricos, podem, quem sabe ter uma redução no patamar de preço no ano que vem”, pondera ele.

“Penso no seguinte: não seria melhor ir devagar, dar tempo ao tempo, ver como a economia reage a essas altas?”, questiona. “Eu prefiro uma administração assim da política monetária, mais lenta mesmo, porque o sobe e desce gera uma volatilidade macroeconômica negativa: é bom para trader, mas ruim para a economia real.”

“Mas, quando o BC vem com doses seguidas de 0,75 ponto percentual, ele começa a correr o risco de exagerar para o outro lado, de talvez elevar a Selic para um patamar muito alto”, afirma, justificando por que avalia que o Copom vai começar a sinalizar elevações menores do juro básico a partir de junho.

O economista utiliza a metáfora do “fool in the shower” (o tolo no banho), criada pelo Nobel de economia, Milton Friedman. A imagem procura representar a velocidade elevada com que um banco central atua para estimular ou desacelerar uma economia ao cair ou elevar muito rapidamente a taxa básica de juros.

“A situação desse ‘fool in the shower’, que aperta muito o botão para sair água quente, e exagera, e faz o mesmo quando é para sair a água fria, é um risco que o BC começa a correr. Ainda não está no radar agora, mas é algo para se monitorar”, diz ele.

Rocha diz que esperava que o Copom deixaria “a porta aberta” para o movimento de elevação da Selic na próximo reunião do comitê, em junho, já que a inflação está bem comportada, na sua leitura. Ainda assim, sustenta que, pela reação do mercado, a decisão da autoridade monetária foi a correta.

“O fato de o BC já comunicar 0,75 pp de alta ocorreu para soar mais hawkish e conseguir o efeito de hoje no câmbio, enquanto a curva de juros se manteve comportada. Se não fosse hawkish assim, o câmbio não teria esse efeito e a curva podia se inclinar mais”, argumenta ele. “Tudo indica que a decisão foi acertada.”

“Mas, quando você olha a composição da inflação, ela está benigna. Então, em algum momento acho que ele vai reduzir esse ritmo, e por isso temos esse viés de baixa para a Selic”, explica ele. Para 2022, a Selic projetada pela JGP também é de 6%, enquanto a firma espera IPCA de 5,4% em 2021 e de 3,7% em 2022.

Sobre o ajuste parcial, ele afirma que seria “errático” o BC ter retirado a menção já no comunicado de ontem. “Imaginei que ele fosse relativizar de forma semelhante como fez. A princípio, a normalização parcial usada no documento não repercutiu bem, pegou na inflação implícita e no Focus, mas ele ajustou isso de uma forma que não comprometa o objetivo de pôr a inflação na meta ano que vem”, diz.

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